Total de visualizações de página

sábado, 28 de abril de 2012

Por uma jornada docente, decente: resgate de uma história não contada.



Essa Indicação foi aprovada pela Câmara de Normas, Planejamento e Avaliação Escolar e rejeitada em novembro de 2010 pelo plenário do CME sob o argumento de que o Conselho não tem competência para legislar sobre jornada docente. Realmente não entendi até hoje a manobra da presidência na época para não ver aprovada essa indicação. Claro que conheço um pouco dos meandros da alma humana, sobretudo, das medíocres que desistem de seus ideais e que não permitem que os outros realizem os seus. Ou seja, a inveja possui um viés servil que procura tirar proveito de situações inusitadas de até passar por cima do Regimento do Conselho. Mas isso aconteceu em minha ausência, e, foi a minha única falta justificada. O mínimo que se poderia esperar era transferir a votação para outra reunião, entretanto o que predominou foi a vileza. O jogo de interesses particulares e mesquinhos já estava armado pela presidência. Relato esse fato para que fique registrado e que o cidadão navegante possa compreender os bastidores do Conselho Municipal de Educação. Esse fato foi um dos motivos da conselheira Vera Athayde pedir para sair do colegiado.

                                                  INDICAÇÃO CME nº 4/2010
Dispõe sobre diretrizes para a constituição da jornada dos Professores PEBII da Secretaria Municipal de Educação de São José do Rio Preto
Interessado: Câmara de Normas, Planejamento e Avaliação Escolar
Relatores: Eugenio Maria Duarte
                 Vera Lúcia de Athayde
                
Ensinar tem sido uma atividade profissional cada vez mais complexa. Aliás, nem sempre foi simples e natural, mesmo nas sociedades primitivas. Na história da educação, a transmissão da herança cultural de uma geração para outra, de forma sistemática, para uma parcela maior da sociedade como educação pública, dar-se-á pela institucionalização da escola pública nos séculos XVIII e XIX tornando obrigatória a educação básica na Prússia, tirando do clero a gestão das escolas que passaram a ser públicas. (ESTEVES & ARAÚJO 2009).
A educação, segundo os preceitos da legislação vigente, tem por finalidade a emancipação do homem – formação de sujeitos autônomos - para o exercício pleno da cidadania.
Entretanto, a educação atual não tem conseguido realizar sua finalidade de formar o cidadão no sentido iluminista e liberal do termo (SILVA, 2003). Isso porque, por um lado, está fundamentada em um paradigma comunicacional ultrapassado, centrado na figura do emissor, no falar-ditar do mestre e, por outro, pelas conseqüências nefastas da sociedade do conhecimento, por sua natureza neoliberal, tem gerado exclusões e aumento da desigualdade social no mundo todo. A maioria da população tem acesso à educação pública, todavia a sua qualidade está comprometida pelas condições precárias na qual se desenvolve e nem todos realmente aprendem no sentido de apreensão do mundo para poder agir como sujeitos livres transformando-o. 
As conseqüências da fragilização da instituição estatal pela imposição do “Estado Mínimo” em nome do fortalecimento do mercado e as terceirizações, debilitaram as instituições familiar e escolar além de outras. Os efeitos trágicos da indústria cultural ao banalizar e influenciar a construção da subjetividade das pessoas tornaram-nas reféns das marcas e grifes dominantes  levando-as à imobilização frente aos seus próprios projetos.
É nesse contexto que podemos afirmar que se a família e a escola não conseguirem cumprir seus papeis de instituições mediadoras entre o indivíduo e a sociedade, ao ensinar sobre o mundo, sobre os valores e sobre os elementos fundamentais para o aprimoramento e desenvolvimento humano, as futuras gerações estarão comprometidas em sua formação humana, vítimas fáceis das manipulações da publicidade e da propaganda, econômicas e políticas.
A escola para cumprir de forma plena a sua função social para a qual foi criada precisa rever as concepções que a fundamenta e reorganizar o seu trabalho pedagógico a fim de atender a todos igualmente.  O modelo criado nos séculos XVIII e XIX está voltado para o atendimento de uma minoria
A escola atual ao atender à totalidade da população na educação básica deve ter  o compromisso de desenvolver uma educação emancipatória, não massificada e romper com a homogeinização. A universalização e a democratização do ensino trouxeram a diversidade para dentro das salas de aula e das escolas.  Para o atendimento eficiente com qualidade é preciso uma mudança de eixo e isso significa que o processo deve centrar-se na aprendizagem e no protagonismo do sujeito.
Nessa concepção a construção dos conhecimentos pressupõe o sujeito ativo, que participa de maneira intensa e reflexiva dos processos educativos. Os alunos são autores do conhecimento e não meros reprodutores. Propõe-se promover uma aventura intelectual dando voz e espaço para a ação dos estudantes promovendo a aprendizagem de forma cooperativa e coletiva.
Nesta direção SILVA (2006), em artigo sobre a Pedagogia do Parangolé pontua que
                   “O aluno não está mais reduzido a olhar, ouvir, copiar e prestar contas. Ele cria, modifica, constrói, aumenta e, assim, torna-se co-autor. Exatamente como no parangolé, em vez de se ter obra acabada, têm-se apenas seus elementos dispostos à manipulação.”

A co-autoria libera os sujeitos para a realização do conhecimento pertinente e crítico que tem como referência, a busca da compreensão do mundo e da realidade. Ademais, a obra aberta desperta a imaginação e as faculdades da inteligência para as possibilidades da inovação e criatividade.
Demo (2008) ao descartar a instrução, argumenta a favor de uma aprendizagem voltada para a pesquisa através da qual, deixa-se de reproduzir e copiar para reconstruir e exercitar a autoria, a criatividade através da arte de argumentar e contra-argumentar, de fundamentar o que se diz, da elaboração constante de textos e da autocrítica.
Segundo HARGREAVES 2004, ensinar na e para além da sociedade do conhecimento significa estimular os alunos para cultivo dos valores como, a democracia, o humanismo, a identidade cosmopolita e comunitária, sendo um contraponto corajoso à sociedade do conhecimento. Para tanto, os professores têm uma tarefa imprescindível e paradoxal pois devem:
“. Promover aprendizagem social e emocional,                compromisso e caráter.
. Aprender a se relacionar de forma diferente com   outros, substituindo as interações esparsas por vínculos e relacionamentos duradouros.
. Desenvolver identidade cosmopolita.
. Comprometer-se com o desenvolvimento profissional e pessoal contínuo.
. Trabalhar e aprender em grupos cooperativos.
. Forjar relacionamentos com pais e comunidades.
. Construir compreensão emocional.
. Preservar a continuidade e a segurança.
. Estabelecer confiança básica nas pessoas.”
       
Esses conhecimentos são vitais para a formação do cidadão planetário. Essa concepção de cidadania tem sido evidenciada a partir de uma nova consciência diante dos graves problemas ecológicos causados pelo modelo econômico vigente que explora e exaure os recursos naturais. GUTIERREZ, 1997 apud GADOTTI, 1998 propõe uma educação para a cidadania planetária e essa supõe o desenvolvimento de novas capacidades tais como a capacidade de sentir, intuir, vibrar emocionalmente, imaginar, criar, auto-organizar-se, pensar holisticamente, buscar causas, comunicar-se e processar e utilizar a imensa informação da aldeia global.
Cidadania crítica, capaz de interagir na construção da sociedade democrática que tem por base a justiça social. É preciso formar para o mercado de trabalho e para a cidadania ao mesmo tempo.
Ainda, segundo HARGREAVES um currículo sobrecarregado, estruturas escolares que fragmentam e dificultam os contatos dos professores com os alunos, pais, e, entre si, impedem a compreensão emocional. O individualismo, a intolerância, a exclusão e a insegurança crescente no mundo precisam ser combatidos com um ensino que cultive o caráter, a idéia de pertencimento a uma comunidade, a inclusão, a integridade, a identidade cosmopolita, a memória coletiva, a simpatia, a democracia e a maturidade pessoal e profissional. O ensino na sociedade do conhecimento pressupõe intelectuais adultos comprometidos com uma missão social para toda a vida. Não pode ser o refúgio para carreiras de segunda opção e muito menos de pessoas sem a qualificação adequada (competência técnica e política).
Frente a esses desafios a escola precisa redimensionar seus tempos escolares e propor um currículo interdisciplinar e contextualizado que desperte o desejo de aprender.
A Lei nº 138/01 que dispõe sobre o Estatuto, Plano de Carreira, Vencimentos e Salários do Magistério Público do município de São José do Rio Preto, elaborada em um contexto de implantação da Lei de Responsabilidade Fiscal utilizada como panacéia, ao garantir a jornada para PEB I de 25 horas com alunos e 10 horas de http (Hora de Trabalho Pedagógico), HTPC (Hora de Trabalho Pedagógico Coletivo), e, excluir os PEBII dessa jornada, agiu em flagrante desrespeito aos princípios da administração pública, deixando esse segmento apenas com uma opção de jornada e, portanto, sem a devida valorização.
Usaram-se dois pesos e duas medidas. Para os Professores de Educação Infantil e os dos  primeiros anos do Ensino Fundamental (1ª à 4ª) uma jornada com a garantia de praticamente 1/3 dessa jornada, fora da sala de aula. Porém para os Professores do Ensino Fundamental (5ª à 8ª) e Ensino Médio apenas 1/5 dessa jornada, fora da sala de aula. Como podemos constatar:

Art. 29 - A jornada semanal de trabalho do Professor de Educação Básica  é constituída de horas em atividades com alunos, de horas de trabalho pedagógico na escola e de horas de trabalho pedagógico em local de livre escolha, a saber:
I - Jornada de trabalho de Professor de Educação Básica I de:
a) 25 (vinte e cinco) horas em atividades com alunos;
b) 10 (dez) horas de trabalho pedagógico, das quais 2 (duas) de HTPC – horas de trabalho pedagógico coletivo na escola,  3 (três)  horas de trabalho no local de livre escolha pelo docente e as demais horas de Preparação de Material, Estudo de recuperação paralela, atendimento à comunidade, distribuídas de acordo com a necessidade da escola.
(...)
II - Jornada de trabalho do Professor da Educação Básica II, composta de:
a) 20 (vinte) horas em atividades com alunos;
b) 4 (quatro) horas de trabalho pedagógico, das quais 2 (duas) horas de trabalho coletivo  na escola e 2 (duas) horas  em local de livre escolha pelo docente.
(...)


O primeiro Estatuto do Magistério Público Municipal de São José do Rio Preto, Lei nº 4451 de 12 de dezembro de 1988, dispunha de três jornadas para o Professor II, a saber: Jornada Integral de 40 horas-aula; Completa de 30 horas-aula e Parcial de 20 horas-aula.
O segundo Estatuto do Magistério, Lei Complementar nº 04 de 28 de dezembro de 1990,  manteve as três jornadas com as mesmas denominações e carga horária.
O terceiro Estatuto, Lei Complementar nº 115 de 21 de março de 2000, estabeleceu duas jornadas. A jornada básica e inicial.
Todavia, destoando de todos os Planos de Carreira anteriores do magistério municipal e mesmo estadual o atual Estatuto e Plano de Carreira, Lei Complementar nº138/01 impôs uma única opção de jornada para PEBII .
O fato mais grave se deu, porém com a concessão da jornada de 25 horas com alunos mais 10 horas de trabalho pedagógico apenas para oito professores (PEBII) sem amparo legal constituindo-se em um ilícito legal. Fato esse que, os relatores dessa indicação, tomaram conhecimento só recentemente, ao pesquisar sobre o assunto para elaborar esse trabalho.
 Até hoje esses professores continuam cumprindo e recebendo pelo FUNDEB por essa jornada. Talvez isso explique em parte a aceitação dos Professores II de uma única jornada. Será que uma parte dos Professores PEB II foi cooptada pelo executivo por essa promessa?
O estilo autocrático de governar do então ex-prefeito Edinho Araújo aliado à omissão deliberada e o servilismo dos dois últimos Secretários de Educação o Sr. Wilson Tadini e a Sra Maria do Rosário Cerávolo Laguna, abriram-se espaços para que se retirassem do Plano de Carreira vigente ( Lei Complementar nº 115/00), sem justificativa fundamentada e desrespeitando os direitos adquiridos, as regulamentações referentes à incorporação da carga suplementar para o cálculo da aposentadoria, ao acúmulo de cargo, ao mestrado e doutorado como critério de evolução funcional assim como licença remunerada para  realizá-los, a exclusão da contagem do tempo de regime celetista para efeitos de qüinqüênio, sexta parte, o adicional de difícil acesso, etc, além da redução de salário de inúmeros servidores.
O executivo municipal ao invés de construir o diálogo com o magistério optou pela juridicalização das demandas sociais ao impetrar uma ação na justiça estadual resultando em liminar contra a Lei Complementar nº115/00 usando-se da influência do ex-juiz aposentado Sr. Adelício Theodoro, Secretário dos Negócios Jurídicos. Aliás, a juridicalização tem servido a determinado interesse corporativo de grupos privilegiados dentro do funcionalismo e não ao interesse público.
A Lei 138/01 foi elaborada pelos funcionários de carreira os Senhores Adilson Vedroni, que respondia na época pela Secretaria de Administração, Luis Roberto Thiese como advogado, e, Orlando Bolçone como Secretário de Planejamento, com a representação de cada segmento do magistério e entidades (Câmara e Sindicato). Entretanto, pela metodologia empregada, pode-se afirmar que o resultado de todo o processo – não poderia ser outro – foi ter um documento fragmentado elaborado por tecnocratas, sem representatividade e legitimidade.
 O que predominou e falou mais alto foram os interesses corporativistas, tanto dos segmentos do magistério quanto do segmento dos funcionários públicos contrários ao Plano de Carreira do Magistério, representados pelos recém investidos pelas novas funções de secretários municipais e assessores, que deslumbrados pelo poder, não conseguiram compreender que a valorização do magistério – elemento indispensável de qualidade na educação - passa, não somente pelo cumprimento legal de se ter um Estatuto e Plano de Carreira, mas pelo compromisso maior de se construir uma cidade educadora e justa que só é possível através de uma educação de qualidade.  Optaram por virar as costas para a relevância política e social da educação municipal e para a valorização daqueles que realizam o ofício de educadores, na formação do novo cidadão planetário.
 O fato que vem corroborar a análise anterior, como se não bastasse, depois do texto aprovado pelo legislativo, o executivo municipal vetou o parágrafo único artigo 1º das Disposições Transitórias, além de três outros vetos.
E o estranho foi o Partido dos Trabalhadores que fazia parte do governo sob a liderança da Vereadora Eni Fernandes e o Sindicato dos Servidores Municipais sob a liderança do Sr. Carlos Henrique e o próprio Conselho Municipal de Educação sob a presidência do Sr, Odair Tortorello, terem-se silenciado ou serem silenciados. Diante disto, pode-se perguntar se houve um pacto de silêncio entre essas lideranças para que as coisas permanecessem como estavam.
Diante dessa situação a retomada dos estudos para a reelaboração do novo Estatuto e Plano de Carreira e de remuneração do Magistério Municipal se faz necessária e urgente. Que os trabalhos sejam iniciados pela contratação de uma assessoria externa, resguardadas as normas do direito financeiro público, (IBAM, FUNDESCOLA, etc) que, a principio, realizaria uma análise do atual Plano (Lei Complementar Nº138/01) à luz das novas Diretrizes Nacionais para os Novos Planos de Carreira e de Remuneração (Parecer CNE/CEB nº9/2009) e do Documento final da CONAE.
O trabalho escolar está alicerçado na práxis docente ao construir o Projeto Eco-Político Pedagógico Coletivo. Para que o professor possa realizar sua função de alta relevância social e política com eficácia é preciso uma jornada que contemple além dos tempos e espaços com o coletivo dos estudantes, momentos semanais para a sua atualização profissional, atendimento à comunidade, aos pais e alunos, horário para preparação coletiva das aulas, recuperação, reforço fora do horário de aula e confecção de materiais didáticos mediados pela TICs (Tecnologias da informação e comunicação).
É preciso superar a imagem do professor “caixeiro viajante” ou puramente “horista” que vai de um lugar a outro vendendo os seus produtos sem ter um lugar fixo.
Essa jornada está garantida na Lei nº 11.738, de 16 de julho de 2008 que regulamenta a alínea “e” do inciso III do caput do art. 60 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, para instituir o piso salarial profissional nacional para os profissionais do magistério público da educação básica e  no  § 4o  diz que a composição da jornada de trabalho, observar-se-á o limite máximo de 2/3 (dois terços) da carga horária para o desempenho das atividades de interação com os educandos.
Dessa forma 1/3 da jornada deverá ser dedicada às horas de trabalho pedagógico (HTP e HTPC), atividades extra-classe como as atividades destinadas à preparação de aulas, reuniões escolares, avaliação, contatos com a comunidade, formação continuada, etc. O Parecer CNE-CEB nº 9/2009 devidamente homologado pelo Ministro da Educação orienta os sistemas de ensino para a sua devida normatização, considerando a realidade de cada sistema.
Passados 20 (vinte anos), somente agora, esse dispositivo legal colocou em prática os princípios da valorização profissional expressos no artigo 206, inciso V da Constituição Federal de 1988 que estabelece:
 “valorização dos/das profissionais da educação escolar, garantidos, na forma da lei, planos de carreira, com ingresso exclusivamente por concurso público de provas e títulos, aos das redes públicas.”
E no artigo 67 da LDBEN de 1996, inciso V ao enfatizar que cabe aos sistemas de ensino promover
“a valorização dos profissionais da educação, assegurando-lhes, inclusive nos termos dos estatutos e dos planos de carreira do magistério público período reservado a estudos, planejamento e avaliação, incluído na carga de trabalho;”


O Plano Nacional da Educação, Lei 10.172 de 09 de janeiro de 2001 ao expressar o compromisso de nação de melhorar a qualidade do ensino como condição “indispensável para assegurar à população brasileira o acesso pleno à cidadania e a inserção nas atividades produtivas, que permita a elevação constante do nível de vida,” assim expressa:
“A implementação de políticas públicas de formação inicial e continuada dos profissionais da educação é uma condição e um meio para o avanço científico e tecnológico em nossa sociedade e, portanto, para o desenvolvimento do País, uma vez que a produção do conhecimento e a criação de novas tecnologias dependem do nível e da qualidade da formação das pessoas”.

O documento final da CONAE (Conferencia Nacional da Educação) que fundamentará e direcionará a elaboração no Novo Plano Nacional da Educação para a próxima década, explicita que a formação dos profissionais da educação deve ser entendida como direito, de forma que supere o estágio das iniciativas individuais para o aperfeiçoamento próprio estabelecendo uma política que associe a carreira (jornada de trabalho e remuneração) outros elementos indispensáveis à valorização profissional. Esse documento explicita:
“faz-se necessária a criação de um plano de carreira que abranja: piso salarial nacional; jornada de trabalho em uma única instituição de ensino, com tempo destinado à formação e planejamento; condições dignas de trabalho; e definição de um número máximo de alunos por turma, tendo como referência o custo aluno-qualidade (CAQ).”

A peculiaridade do trabalho do Professor II (que atua do 6º ao 9º ano e Ensino Médio) exige uma flexibilidade para a constituição da sua jornada uma vez que é constituída por hora-aula para atender as necessidades da matriz curricular da escola. Há componentes curriculares que têm 04 (quatro) aulas semanais, outros 02 (duas) ou mesmo 01 (uma) aula.
 Para atender a essa diversidade e garantir a valorização docente como determina a legislação vigente, propõe-se três opções de jornada que são constituídas em todo o início de ano letivo, assim dispostas:

I - Jornada Inicial de trabalho do Professor da Educação Básica II, composta de:
a) 12 (doze) horas em atividades com alunos;
b) 4 (quatro) horas de trabalho pedagógico, das quais 2 (duas) horas de trabalho coletivo  na escola e 2 (duas) horas  em local de livre escolha pelo docente.

                                       II - Jornada Básica de trabalho do Professor da Educação Básica II,  composta de:
a) 20 (vinte) horas em atividades com alunos;
b) 6 (seis) horas de trabalho pedagógico, das quais 2 (duas) horas de trabalho coletivo  na escola e 2 (duas) horas  em local de livre escolha pelo docente.
                                        III - Jornada Integral de trabalho do Professor da Educação Básica II,    
                                           composta de:              

                                                      a) 25 (vinte e cinco) horas em atividades com alunos;
b) 10 (dez) horas de trabalho pedagógico, das quais 2 (duas) de HTPC – horas de trabalho pedagógico coletivo na escola,  3 (três)  horas de trabalho no local de livre escolha pelo docente e as demais horas de Preparação de Material, Planejamento,avaliação, Estudo de recuperação paralela, atendimento à comunidade, distribuídas de acordo com a necessidade da escola.



O trabalho docente de qualidade está embasado no processo contínuo de sua qualificação científica e pedagógica como elemento indispensável para o exercício da competência técnica. Todavia, é preciso enfatizar como no início dessa indicação, o professor como intelectual orgânico desenvolve um trabalho transformador educando para um mundo melhor e mais justo que está em processo de construção. Isso pressupõe a realização do Projeto Eco-Político Pedagógico da escola, no qual se define a organização dos tempos e espaços, o currículo e as concepções de educação, ensino-aprendizagem, avaliação, de ser humano que se deseja formar e de sociedade. O educador é o artífice principal desse processo.
O poder público ao garantir as condições de realização de uma educação de qualidade ao estabelecer uma jornada docente adequada, aposta e acredita na capacidade de todos os profissionais da educação para que se diminuam significativamente os ainda insustentáveis índices de retenção e evasão bem como, a aprendizagem efetiva de todos os alunos, independente de sua posição social ou econômica, seja uma realidade, sobretudo, para esses níveis de atuação do PEB II (Professores II).
                    Esta Indicação foi discutida e aprovada pela Câmara de Normas, Planejamento e Avaliação Escolar, encaminhada para o plenário do Colegiado para análise e aprovação, juntamente com proposta de Deliberação.
São José do rio Preto, 11 de novembro de 2010

segunda-feira, 23 de abril de 2012

O Conselho Municipal de Educação neste 1º semestre de 2012.


Eugenio Maria Duarte
As atividades do presente ano do Conselho Municipal de Educação tiveram início na segunda quinta-feira do mês de fevereiro dia 08/02. Das ações mais relevantes poderíamos destacar o pedido de afastamento do conselheiro Artur. A resposta desse pedido aconteceu na última reunião dia 12/04 com o seguinte encaminhamento: a presidência do conselho encaminhá ofício para a Sra secretária da educação no qual solicita o preenchimento de vaga da representação desse segmento do Ensino Superior com o suplente Sr Elso assumindo a titularidade e havendo a indicação de outro representante para assumir a suplência.
As outras demandas são as que normatizam o ensino da música no município. O parecer já foi aprovado pela câmara e passará pelo conselho pleno numa reunião extraordinária marcada para o dia 03/05/2012. Nesta sessão ainda será discutido proposta de encaminhamento sobre a educação integral em tempo integral constituindo-se num segundo tema para estabelecer as suas diretrizes.
Sobre o ensino da lingua espanhola ainda continua em aberto. Há posicionamentos divergentes por referir-se ao ensino médio. Uma vez que houve a normatização estabelecendo as diretrizes para a implantação das disciplinas de sociologia e de filosofia, seria, no mínimo contraditório, não implantar  o ensino da lingua espanhola, alegando que o município só deve cuidar da educação infantil e do ensino fundamental. O município por decisão do executivo assumiu o que já havia ao criar o sistema municipal de ensino autônomo. De qualquer  forma,  se há dúvidas por que não consultar o Conselho Estadual de Educação?
Outra demanda que entrará na próxima pauta será sobre os conselhos escolares e a gestão democrática. Esse tema poderá ser uma oportunidade ímpar para que a participação aconteça de fato, não somente no âmbito das escolas, mas do sistema de ensino fortalecendo um conselho de educação verdadeiramente autônomo.
Por fim, nas oportunidades das falas dos conselheiros tenho me posicionado para que o conselho cumpra o seu plano de trabalho que foi aprovado pelo conselho pleno em 2010. Esse plano resgata três ações fundamentais: 1. retomar o processo de planejar, elaborar o novo Plano Municipal de Educação como plano de Estado e não de governo; 2. articular ações de fortalecimento dos conselhos escolares; 3. inscrever o município no Plano de mobilização pela educação do MEC.

O Ensino Religioso em São José do Rio Preto. Resposta aos que me perguntaram.

Eugenio Maria Duarte

                 A proposta era desafiadora. Implantar o Ensino Religioso na Rede Municipal  de Ensino de São José do Rio Preto a partir da nova redação do artigo 33 da LDB com a Lei 9475 de 22 de julho de 1997.
                  Com a Indicação nº 05/2001 do Conselho Municipal de Educação, as Leis Municipais n° 8748 de 10 de outubro de 2002 , n° 8751 de 15 de outubro de 2002, e a Resolução SME 002/03 de 04 de fevereiro de 2003, tínhamos as bases legais para que o processo de construção do Ensino Religioso no Ensino Fundamental e a Educação em Valores na Educação Infantil, iniciasse nas escolas.
                 Através da assessoria do FONAPER (Fórum Nacional Permanente de Ensino Religioso) e o intercâmbio com o Colégio Guilherme Dumont Villares - que desenvolvia o Projeto Considere e uma Proposta Pedagógica embasada na educação em valores e no voluntariado - foram construídos os Referenciais do Ensino Religioso e da Educação em Valores. Isto é, o Ensino Religioso deverá ser desenvolvido dentro do espírito da proposição legal: “assegurado o respeito à diversidade cultural e religiosa do Brasil, vedada quaisquer forma de proselitismo”.
                   A linha proposta fundamentava-se na construção do diálogo e da reverência. A categoria da diversidade completava o tripé que sustentava tanto o Ensino Religioso quanto a Educação em Valores. Somos diferentes, entretanto, temos em comum um atributo simples: somos humanos, nada mais, nada menos como expressa o poeta.
                   Isso foi no início 2003 sob a liderança da Secretária da Educação Municipal, Profª Duda. Suas orientações foram marcadas pela ênfase na educação em valores. Entretanto, essa visão não impossibilitou a contratação da equipe do FONAPER em realizar algumas capacitações e sensibilização do pessoal docente e gestores interessados. A proposta do Fonaper não trabalha na linha da educação em valores, mas no entendimento do Ensino Religioso como área de conhecimento como determinado nas Diretrizes Curriculares Nacionais. Isto é, seu objetivo é investigar o fenômeno religioso através de uma metodologia dialógica e construtiva do conhecimento religioso.
                 Nesta linha procurei oferecer cursos de capacitação para os docentes – dois anuais - até março de 2011 com a assessoria do Fonaper através de sua representante no nosso município, Profª Leonor Maria Bernardes Neves.
               A partir do ano de 2009 algumas ações foram desencadeadas como encaminhar às Unidades Escolares as assinaturas da Revista do Ensino Religioso “Diálogo” e do Jornal “O Transcendente” para servir de subsídio aos preparos de aulas e desenvolvimento deste componente curricular. Foram encaminhadas também ações que articulavam a Campanha da Fraternidade anual da CNBB com os temas transversais que perpassam o currículo escolar. A Resolução SME 002/03 de 04 de fevereiro de 2003 indicava que a implantação do Ensino Religioso fosse gradativa de 6º ao 9º ano, sendo que no 8º e no 9º já deveria ser iniciado com o professor especialista. No entanto, passaram-se os anos e nos 6ºs e no 7ºs anos ainda não temos o Ensino Religioso. Não foi por falta de proposta para a atual Secretária da Educação de, inclusive, incluir vagas no último Concurso Público.
                  Por fim, após dois anos nesta administração apresentei à Profª Telma, no início de 2011, as dificuldades de continuar, em nível de rede municipal, como o responsável por esse componente curricular nos moldes que estava montado, deixando-a, inclusive com liberdade, para implantar algum projeto próprio que pelo que parece é o mesmo que está tramitando no congresso nacional: o ensino religioso confessional. 

domingo, 8 de abril de 2012

MG, paga o mais baixo piso salarial do Brasil de professor e SP a menor jornada extraclasse.

 Essa matéria é do final do ano passado e o piso foi reajustado em 22% indo para R$1.451,00, mas é muito ilustrativa, sobretudo, ao observar os dois Estados em destaque, por serem governados por um mesmo partido ou grupo político por mais de décadas. Se fizéssemos um quadro comparativo entre os municípios seria constatado que nosso município de São José do Rio Preto, também não cumpre a Lei do Piso. Em outubro do ano passado encaminhei ofício para a Secretária Municipal de Educação sobre o cumprimento da referida lei (nº 11.738/2008) e a resposta foi a de ter encaminhado a demanda para o jurídico da prefeitura responder. Até hoje não se tem uma resposta. Ou seja: será que engavetaram? Se fosse para consultar a posição do jurídico teria encaminhado para esse setor, digo, secretaria. Está na hora de cada profissional da educação docente encaminhar requerimento solicitando o cumprimento da lei. Foi exatamente assim que os Assistentes Sociais conseguiram a redução da jornada. Protocolaram individualmente e eles não são nem 10%  - numericamente falando - dos professores da rede.

Aprovada há mais de três anos, a lei nacional do piso do magistério não é cumprida em pelo menos 17 das 27 unidades da Federação.

A legislação prevê salário mínimo de R$ 1.187 a professores da educação básica pública, em jornada semanal de 40 horas, excluindo as gratificações, e assegura que os docentes passem ao menos 33% desse tempo fora das aulas.

A ideia é que os professores tenham melhores condições de trabalho com aumento salarial e período remunerado para atender aos alunos, preparar as aulas e estudar.O levantamento da Folha com as secretarias estaduais de Educação mostra que a jornada extraclasse é o ponto mais desrespeitado da lei: 15 Estados a descumprem, incluindo São Paulo, onde 17% da carga é fora da classe.

Desse grupo, quatro (MG, RS, PA e BA) também não pagam o mínimo salarial, ou seja, estão totalmente fora da legislação nacional. Outros dois desrespeitam só o salário.Para aumentar o período dos docentes fora da sala de aula é preciso contratar mais profissionais ou elevar a carga dos que já estão na rede -ambas opções são custosas.A lei pode ajudar professores como Diliana Márcia de Barros Lisboa, 43, que leciona história e geografia a adolescentes em duas escolas estaduais de Minas Gerais. Seu salário base é R$ 712.

Ela só consegue corrigir trabalhos e preparar aulas à noite. "Com esse salário, apenas sobrevivo", diz Diliana.

IMBRÓGLIO JURÍDICO

A implementação da lei do piso foi conturbada. Sancionada em julho de 2008, foi contestada três meses depois no Supremo Tribunal Federal pelos governos de MS, PR, SC, RS e CE. Uma das principais argumentações era que a regra significava intromissão em assunto que caberia a cada Estado e município.

Em abril deste ano, o Supremo decidiu que a lei não fere a Constituição.

O Ministério da Educação afirma que a regra deve ser aplicada imediatamente, mas que não pode obrigar Estados e municípios a cumpri-la.Por outro lado, a gestão Dilma disse que pode ajudar redes com dificuldades financeiras, desde que elas comprovem a necessidade -o que não tem ocorrido, afirma o Ministério da Educação.A Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação disse que recomendou a seus sindicatos que entrem na Justiça para cobrar a adoção. Governadores e secretários podem sofrer ações de improbidade administrativa.

"Estados e municípios não se prepararam porque apostaram que ganhariam no Supremo", disse o presidente da confederação, Roberto Leão.O Consed (órgão que reúne secretários estaduais de Educação) disse ser favorável à lei, mas que é necessário um período para transição. "O impasse não interessa a ninguém", disse o vice-presidente Danilo de Melo Souza.Da Folha para assinante
Fonte: blog "amigosdopresidentelula"








sexta-feira, 6 de abril de 2012

A crucificação de Cristo, o suicídio e a rebelião em Atenas



por Mauro Santayana


O homem que prenderam, interrogaram, torturaram, humilharam, escarneceram e crucificaram, na Palestina de há quase dois mil anos, foi, conforme os Evangelhos, um ativista revolucionário. Ele contestava a ordem dominante, ao anunciar a sua substituição pelo reino de Deus. O reino de Deus, em sua pregação, era o reino do amor, da solidariedade, da igualdade. Mas não hesitou em chicotear os mercadores do templo, que antecipavam, com seus lucros à sombra de Deus, o que iriam fazer, bem mais tarde, papas como Rodrigo Bórgia, Giullio della Rovere, Giovanni Médici, e cardeais como os dirigentes do Banco Ambrosiano, em tempos bem recentes. O papa reinante hoje, tão indulgente com os gravíssimos pecados de muitos de sua grei, decidiu, ex-catedra, que as mulheres não podem exercer o sacerdócio.
Ao longo da História, duas têm sido as imagens daquele rapaz de Nazaré. Uma é a do filho único de Deus, havido na concepção de uma jovem virgem, escolhida pelo Criador. Outra, a do homem comum, nascido como todos os outros seres humanos, em circunstâncias de tempo e lugar que o fizeram um pregador, continuador da missão de seu primo, João Batista, decapitado porque ameaçava o poder de Herodes Antipas. Tanto João, quanto Jesus, foram, como seriam, em qualquer tempo e lugar, inimigos da ordem que privilegiava os poderosos. Por isso – e não por outra razão – foram assassinados, decapitado um, crucificado o outro.
Um e outro tiveram dúvidas, segundo os evangelistas. João Batista enviou emissário a Jesus, perguntando-lhe se era mesmo o messias que esperava, e Cristo, na agonia, indagou a Deus por que o abandonava. Os dois momentos revelam a fragilidade dos homens que foram, e é exatamente nessa debilidade que encontramos a presença de Deus: os homens sentem a presença do Absoluto quando as circunstâncias o negam. João Batista sentia-se movido pela fé, ao anunciar a vinda do Salvador.
Era um ativista, pregando a revolução que viria, chefiada por outro, pelo novo e mais poderoso dos profetas. Ao saber que Cristo pregava e realizava milagres, supôs que ele poderia ser aquele que esperava, mas duvidou. Nesse momento, moveu-se pela esperança de que o jovem nazareno fosse o Enviado – o que confirmaria a sua fé. Cristo, na hora da morte, talvez levasse a sua dúvida mais adiante, e se perguntasse se a sua morte, que previra e esperara, serviria realmente à libertação dos homens – desde que salvar é libertar. O Reino de Deus, sendo o reino da justiça, é a libertação. Daí a associação entre essa felicidade e a vida eterna, presente em quase todas as religiões. Na pregação de Cristo, a libertação começa na Terra, na confraternização entre todos os homens. Daí o conselho aos que o quisessem seguir, e ainda válido – repartissem com os pobres os seus bens, como fizeram, em seguida, os seus apóstolos, ao criar a Igreja do Caminho. Se acreditamos na vida eterna, temos que admitir que a vida na Terra é uma parcela da Eternidade, que deve ser habitada com a consciência do Todo. Assim, a vida eterna começa na precariedade da carne.
Quarta-feira passada – quando em São João del Rei, em Minas, a Igreja celebrou o Ofício das Trevas no rito antigo – um grego, Dimitris Christoulas, chegou pela manhã à Praça Syntagma, diante do Parlamento Grego, buscou a sombra de um cipreste secular, levou o revólver à têmpora, e disparou. Em seu bilhete de suicida estava a razão: aos 77 anos, farmacêutico aposentado, teve a sua pensão reduzida em mais de 30%, ao mesmo tempo em que se elevou brutalmente o custo de vida. As medidas econômicas, ditadas pelo empregado do Goldman Sachs e servidor do Banco Central Europeu, nomeado pelos banqueiros primeiro ministro da Grécia, Lucas Papademos, não só reduziram o seu cheque de aposentado, como o privaram dos subsídios aos medicamentos. “ Quero morrer mantendo a minha dignidade, antes que me veja obrigado a buscar comida nos restos das latas de lixo” – escreveu em seu bilhete de despedida, lido e relido pelos que tentaram socorrê-lo, e que se reuniam na praça.
“Tenho já uma idade idade que não me permite recorrer à força – mas se um jovem agora empunhasse um kalashinov, eu seria o segundo a fazê-lo e o seguiria”.
No mesmo texto, Christoulas incita claramente os jovens gregos sem futuro à luta armada, a pendurar os traidores, na mesma praça Syntagma, “como os italianos fizeram com Mussolini em Milão, em 1945”. O tronco do cipreste se tornou painel dos protestos escritos. Em um deles, o suicídio de Christoulas é definido como um “crime financeiro".
A morte de Christoulas, em nome da justiça, pode trazer nova esperança ao mundo, como a de Cristo trouxe. Não importa muito se ainda não foi possível construir o reino de Deus na Terra, e tampouco importa que o nome de Cristo tenha sido invocado para justificar tantos e tão repugnantes crimes. No coração dos homens de boa vontade, qualquer que seja o seu calvário – porque todos os homens justos o escalam, onde quer que nasçam e morram – a felicidade os visita quando comungam do sentimento de amor de Cristo pela Humanidade. Nesses momentos, ainda que sejam apenas segundos fugazes, habitamos o Reino de Deus.
Nunca, em toda a História, tivemos tanto desdém pela vida dos homens, como nestes tempos de ditadura financeira universal. Estamos vivendo vésperas densas de medo, mas dentro do medo, há centelhas de esperança. A morte do aposentado, quarta-feira de trevas, em Atenas, é, com toda a carga trágica de seu gesto, partícula de uma dessas centelhas.
Estamos cansados de sangue, mas o que está ocorrendo hoje – teorizem como quiserem economistas e sociólogos – é a etapa seguinte do grande projeto dos neoliberais, que vem sendo executado sistematicamente pelos que realmente mandam no mundo e que assumiram sua governança (para usar o termo de seu agrado), mediante a Trilateral e o Clube de Bielderbeg, controlados, como se sabe, por meia dúzia de poderosas famílias do mundo. Esse projeto é o de dizimar, por todos os meios possíveis, a população, e transformar a Terra no paraíso dos 500.000 mais poderosos, ricos e eleitos, em oposição à utopia cristã. Mas é improvável que os pobres, que são a maioria, não identifiquem seu real inimigo, e se sacrifiquem, sem resistência, ao Baal contemporâneo – esse sistema financeiro que acabou com a antiga sacralidade da moeda, ao emitir papéis sem nenhuma relação com os bens reais do mundo, nem com a dignidade do trabalho. A força da mensagem do nazareno deve ser retomada: os oprimidos – negros, brancos, mestiços, muçulmanos, cristãos, budistas e ateus – devem compreender que os habita o homem, e não animais distintos, destinados à violência em proveito dos promotores da barbárie.
Ao expirar, depois de torturado, ultrajado seu corpo, humilhado, escarnecido, Cristo se tornou a maior referência de justiça. Aos 77 anos, o aposentado grego, ao matar-se, transformou-se em bandeira que ameaça iniciar, na Grécia, novo movimento em favor da igualdade – a mesma idéia que levou Péricles a fundar o primeiro estado de bem-estar social, ao reconstruir Atenas, empregar todos os pobres, e dotar os marinheiros do Pireu do pioneiro conjunto de casas populares da História.


Vinte séculos podem ter sido apenas rápido intervalo – um pequeno descanso da razão.


quarta-feira, 4 de abril de 2012

Cultura: propriedade comum ou mercadoria

Uma excelente reflexão para todos os educadores engajados e comprometidos com uma educação transformadora.

Emir Sader
No momento em que se avança no processo de privatização na que já foi um marco na TV pública brasileira – a TV Cultura de São Paulo – e ainda persiste um mandato no Minc que promoveu graves retrocessos na política de propriedade comum e convive de forma promíscua com o Ecad, vale a pena recordar que um dos mais importantes debates contemporâneos se deu justamente sobre a natureza da cultura: propriedade comum ou mercadoria.
Foi uma longa e tensa discussão no âmbito da Unesco, em que os Estados Unidos defendiam a inespecificidade da cultura, como uma mercadoria a mais, que deveria ser submetida às normas do livre comércio e estar no âmbito da Organização Mundial do Comércio. Não poderia haver visão mais mercantilizada da cultura, que aceleraria ainda mais o achatamento da diversidade cultural em beneficio dos modelos de consumo das potências centrais do capitalismo.
A posição - que finalmente triunfou - considera a especificidade da cultura como forma de definir as distintas identidades dos países, dos povos, das nações, que requer tratamento e proteção especifica. Por detrás do debate estava a contraposição entre a cultura como mercadoria e a cultura como patrimônio da humanidade, como propriedade comum. É a forma particular de refletir os grandes debates e dilemas contemporâneos entre esfera mercantil e esfera pública, entre neoliberalismo e pós-neoliberalismo, no plano da cultura.
Até o governo Lula predominou essa visão mercantil da cultura, de que um dos reflexos mais claros foi a Lei Rouanet de incentivo à cultura, em que o governo renuncia a seu papel de fomento da cultura e permite que empresas privadas deixem de pagar impostos para financiar atividades de propaganda das empresas, sem nenhum critério artístico. Ao invés de pagar seus impostos, as empresas privadas promovem sua imagem, em lugar do governo definir os critérios públicos de repartição de recursos.
O mandato do Gil e do Juca havia proposto reformulação da Lei de incentivo à cultura, que não avançou neste mandato, foi revista com os critérios que presidem esse mandato, de menor intervenção do poder público e de favorecimento dos mesmos mecanismos que presidem a lei ainda vigente.
A promiscuidade com o Ecad e a retirada do selo da propriedade comum vão na mesma direção, de ruptura com todos os avanços do mandato anterior, que fortaleceram o Minc no governo Lula e que projetaram uma imagem de governo dos mais avançados no mundo em termos de políticas culturais. A presença de um ministério fraco e sem apoio tem feito com que ressurjam teses de que os temas de propriedade e a própria Ancine deveriam estar subordinadas ao Ministério de Indústria e Comércio, formalizando os retrocessos sobre o caráter público da cultura.
É a mesma lógica de privatização da cultura que tem feito com que os tucanos destruam a melhor TV que o Brasil chegou a fazer, no auge da TV Cultura. Nas programações informativas, de debate politico, nas programações infantis, culturais – ela vai chegado a disputar audiência com a TV Globo em São Paulo. Os tucanos retiraram recursos e jogaram a TV Cultura na lógica de buscar recursos privados e, assim, ter que se submeter aos critérios das agências de publicidade e das empresas privadas, tirando paulatinamente o caráter diferenciado, público, da TV Cultura, até se chegar à desagregação de uma TV totalmente subordinada aos desígnios – e conflitos – internos do PSDB.
A luta pela eleição de um candidato alternativo em São Paulo, assim como por uma substituição no Minc que permita o resgate das políticas culturais de caráter público, é a mesma luta pela democratização da cultura e dos meios de comunicação no Brasil hoje.