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quarta-feira, 26 de setembro de 2012

O homem como animal político?




“O que ele quis dizer foi simplesmente que é exclusivamente do homem poder viver numa pólis e que a pólis organizada é a forma mais elevada de vida em comum humana, algo especificamente humano e, portanto, equidistante dos deuses, que podem existir em e de si mesmos em total liberdade e independência, e dos animais, cuja vida em comum, se é que existe algo assim, é uma questão de necessidade”.
(ARENDT, H. A promessa da política. Rio de Janeiro: Editora Difel, 2008, p. 170.)


Hannah Arendt (1906-1975) faz referência a Aristóteles no texto acima e critica as interpretações correntes deste pensador, sobretudo, a realizada pelo cristianismo. A crítica de Arendt em relação às interpretações correntes do pensamento político de Aristóteles procura resgatar o sentido originário proposto pelo filósofo estagirita da palavra politikon.  Para ela, politikon expressa a idéia da pluralidade e da liberdade humana que se manifesta na vida da polis. Para os gregos a realização da política era a mais nobre das ações humanas uma vez que se buscava a concretização da sua finalidade, a saber: o bem comum e a justiça. Ou seja, é no exercício da própria liberdade na pluralidade dos cidadãos em interação entre iguais e diferentes que a finalidade da polis se realizaria. Parece que podemos encontrar a partir das interpretações cristãs do pensamento aristotélico feita, sobretudo, por São Tomás de Aquino, a idéia segundo a qual o “homem é um ser político” por essência, idéia que a autora rebate, pois o ser humano é apolítico.
            Ao fundamentar sua critica na análise da imagem da Sagrada Família e da idéia monoteísta de Deus, Arendt aponta o caminho para a sua superação. Para Arendt  ao transformar o que é estranho e diferente  em familiar abolindo as diferenças, acaba-se abolindo o próprio espaço político, que é constituído da pluralidade. A imagem da sagrada família, ao estabelecer relações de parentesco entre os indivíduos acaba anulando o que é essencial em cada indivíduo que é a sua liberdade e singularidade.  Por outro lado o conceito monoteísta de Deus criou a idéia de humanidade. “O homem criado à imagem e semelhança da solidão de Deus, está na base do “estado de natureza de Hobbes” como “uma guerra de todos contra todos.”
              A atualidade do pensamento de Arendt nos ajuda a refletir  sobre os problemas e os desafios urbanos que vão desde o consumo de drogas e a população de rua que demanda por direitos até aos problemas da precariedade dos transportes e o drama das enchentes, além de outros. O contexto totalitário no qual Arendt atuou talvez possibilitasse repensar as dificuldades das sociedades em saber conviver com as diferenças procurando eliminá-las, seja por práticas eugenistas ou por políticas públicas higienistas como ocorrida recentemente ao retirar os dependentes de crack das regiões centrais da capital paulista.
              Ao fazer a crítica destas políticas públicas baseadas nas idéias de Arendt, nossos alunos terão oportunidade de ampliar e fortalecer sua concepção política e capacidade de julgar com critérios, uma vez que o grande desafio da política atual é aprender a conviver com as diferenças construindo uma sociedade livre de preconceitos, democrática e plural.

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